quarta-feira, 25 de fevereiro de 2015

Chico Xavier foi o "pai dos 'fakes'"

Por Senhor dos Anéis

Em 1932, muito antes de alguém pensar sequer em contatos virtuais on line - mal havia o telefone e o código morse, como formas de comunicação à distância - , uma pessoa já era pioneira no uso de fakes através da apropriação de nomes de pessoas falecidas.

Francisco Cândido Xavier, aquele católico fervoroso que sempre colecionou imagens de santas ao longo da vida e que falava com espírito de padre jesuíta - apelidado de Emmanuel, mas o mesmo severo e brutal padre Manuel da Nóbrega - , e que nunca esteve aí para Allan Kardec (único autor que se recusava a ler e seguir com veemência), foi o pioneiro dessa forma "simpática" de cometer falsidade ideológica.

Seu livro Parnaso de Além-Túmulo, lançado naquele ano em que outras pessoas tinham coisas mais úteis à fazer, como os paulistas, elitismos e reacionarismos à parte, tentaram mobilizar pela emancipação de seu Estado, no famoso nove de julho, foi uma "pérola" no uso de fakes muito antes da farra digital de hoje em dia.

Consta a versão oficial de que Parnaso de Além-Túmulo foi uma antologia de vários poetas e escritores falecidos que traziam mensagens edificantes do mundo espiritual, em obras de profundo refinamento literário, de elevação moral e blablablá.

No entanto, uma observação sempre vigilante e cautelosa faz constatar que os poemas publicados no livro percebe que os poemas contrariam drasticamente os estilos originais dos autores a eles atribuídos de maneira não obstante desastrosa e constrangedora.

Os poemas atribuídos a Auta de Souza, bela e precocemente falecida poetisa potiguar, nem de longe lembram o estilo gracioso da linda negra de versos delicados. Os atribuídos a Olavo Bilac são pachorrentos e em nada lembram o refinamento lírico e a métrica rigorosa dos versos cantaroláveis do poeta parnasiano. Os de Casimiro de Abreu nem chegam perto do lirismo juvenil do poeta ultrarromântico e por aí vai.

O grande problema, que transforma Parnaso de Além-Túmulo num completo desastre que só a fé cega dos chiquistas deixa passar - eles aplaudiriam até se Chico Xavier psicografasse o zumbido de um falecido mosquito aedes aegypti - , é que o livro deveria ser uma obra inacabada e intocável de poesia espírita, mas não foi.

Estranhamente, a "maravilhosa obra" foi remendada drasticamente aqui e ali, com inclusões e exclusões de poemas e escritores, muitos tendenciosos, outros problemáticos, com versos remendados aqui e ali, havendo até a confusão de autorias atribuídas, como Augusto dos Anjos confundido com Antero de Quental.

OBRA REMENDADA CINCO VEZES EM DUAS DÉCADAS!

Mas o remendo não foi apenas uma vez, mas CINCO! E não foi em um ano, mas durante VINTE E TRÊS ANOS. Como a "maravilhosa obra" teve que ser remendada cinco vezes e durante pouco mais de duas décadas é um grande mistério, se ficarmos presos à tese de que se trata de uma "verdadeira obra dos espíritos do além".

Para piorar, quando o sobrinho de Chico Xavier ameaçou explicar tudo direitinho e denunciar as fraudes, criou-se uma campanha difamatória contra esse menino, Amauri Xavier, além do rapaz morrer cedo demais para alguém que só vivia "bebendo muito". Queima-de-arquivo?

Mas, antes desse escândalo todo, Chico Xavier havia deixado vestígios, quando, em correspondências com o então presidente da Federação "Espírita" Brasileira, Antônio Wantuil de Freitas, agradecia à contribuição deste e dos editores da FEB pela "revisão" e "correção" dos textos de Parnaso de Além-Túmulo, que Chico não fazia por "falta de tempo". Como assim?

E antes que algum chiquista reclamasse e dissesse que as acusações de que Parnaso de Além-Túmulo era feito por Chico "ele mesmo" em parceria com escritores, editores e consultores literários vêm da intolerância de católicos do porte de Alceu Amoroso Lima (que, embora conservador, foi muito mais humanista que Xavier), a revelação vem de fontes FAVORÁVEIS a Chico Xavier.

Sim. É só ler Testemunhos de Chico Xavier, de Suely Caldas Schubert, editado pela FEB, portanto um documento entusiasmadamente A FAVOR de Chico Xavier, que as tais cartas estão lá: Chico Xavier PEDINDO AJUDA a escritores e editores para reparar Parnaso de Além-Túmulo.

HUMBERTO DE CAMPOS

A propósito, quando o referido livrinho poético foi lançado, cheio de fakes evocando nomes de autores falecidos, o escritor e membro da Academia Brasileira de Letras, Humberto de Campos, ainda vivo, resenhou o livro com aquela ironia de sempre.

Ele "reconheceu o mérito" da obra, dizendo que os textos "são parecidos" com que os autores fizeram em vida, numa argumentação que a gente até desconfia que seja alguma ironia de sua parte. Em seguida, ele, com seu jeitão humorístico, disse para que os espíritos do além não enviem poemas para não competir com os poetas vivos na expressão e no sucesso de vendas no mercado literário.

Chico Xavier não gostou das críticas e, irritado, resolveu fazer uma desforra. Alegando a um amigo que teve um sonho em que um suposto Humberto de Campos vinha, no além, perguntar se Chico era o "menino que organizou" o referido livro, sonhado um ano após o falecimento do escritor maranhense (em 1934, aos 48 anos), Chico resolveu se apossar do nome do escritor.

E aí, veio uma enxurrada de livros "espirituais" com o nome de Humberto de Campos que NADA TINHAM A VER com o estilo literário original do escritor. Se Humberto, em vida, preferia falar de personalidades políticas e literárias, num texto ao mesmo tempo coloquial e refinado, culto e descontraído, o "espírito" vinha com um estilo completamente diferente.

O "espírito Humberto de Campos" vinha com uma linguagem melancólica, chorosa, deprimente, falando mais de assuntos bíblicos, sob a perspectiva que mais parece a de um sacerdote católico, com textos pedantes e nem tão refinados assim, e obras em muitos aspectos mal escritas e falhas em muitas referências históricas nelas descritas.

Um Brasil, Coração do Mundo, Pátria do Evangelho, seguramente, NUNCA seria escrito por Humberto de Campos, pois esta obra tem uma narrativa risível dos fatos históricos brasileiros, próprios dos piores livros didáticos, que mostravam muitas mentiras e falsos heróis.

A brincadeira de Chico Xavier custou um processo judicial movido pelos herdeiros de Humberto de Campos, quando até o advogado percebeu muito bem que os livros nada tinham do estilo do falecido escritor. Só que os juízes não entendiam a questão de direitos autorais para obras atribuídas a autores espirituais e fecharam o processo dando empate nos dois lados.

Só que o empate foi favorável a Chico Xavier, cujo mito se agigantou ao longo das décadas, como um lutador de UFC, que usava doping o tempo todo, vencendo todos os campeonatos na hipótese de ser proibido qualquer exame de doping que viesse a prejudicá-lo.

Desse modo, Chico Xavier cresceu com a ajuda do "jeitinho brasileiro". Com o tempo, passou a assumir, até o fim da vida, o estereótipo do "velhinho bonzinho". Seus fakes se multiplicaram e foram dados como autênticos, décadas antes da popularização da Internet no Brasil.

E, para piorar, o antes prestigiado, diferenciado e respeitado Humberto de Campos, praticamente, foi hoje reduzido a um dos fakes de Francisco Cândido Xavier. E quase ninguém desconfia.

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